Ao redor do mundo contemporâneo
crise é a palavra mais pronunciada,
indubitavelmente. Na sofisticada Europa, no crescente Tigre asiático, no
poderoso EUA e nas terras latino-americanas, inclusive, no Brasil, a realidade
ou o imaginário da crise perpassa as
mais diversificadas mentes e casas. Famílias desestabilizadas, casamentos
abalados, recursos escassos são reflexos dos colapsos econômicos que estremecem
os alicerces globais. Desemprego, desilusão e desesperança são latentes em
milhões de pessoas ao redor do mundo, de igual modo no Brasil, onde
os jornais impressos ou televisivos noticiam a cifra/ margem de mais de 14
milhões de desempregados. Como o cristão deve enxergar essa situação? Como a
Palavra de Deus nos conduz a perceber esses períodos de crise que assolaram e
assolam nações ao longo da História ao redor do mundo e hoje no nosso próprio
país? De maneira objetiva é o que vamos procurar ver/refletir nesse devocional.
Em primeiro lugar é importante não
perder de vista a soberania de Deus.
O descontrole governamental das autoridades políticas, administrativas ou militares
jamais serão reflexos de um suposto descontrole de Deus. As Escrituras revelam
que Deus é o criador deste mundo (Gênesis 1-2), o salmista proclama o fato de
que “Do Senhor é a terra e toda a sua plenitude” (Salmo 24.1), nas palavras do
profeta Ageu, Deus é “Dono do ouro e da prata” (2.7), enquanto o autor de
Hebreus assinala o fato de que Deus “Fundou a terra, e os céus são obras de
tuas mãos” (1.10). Ao contrário da perspectiva Deísta que entende Deus
meramente como o princípio criador que gerou todas as coisas e estabeleceu
leis físicas que regem a criação, sem jamais, interferir nela, a
posição bíblica revela Deus não apenas como o criador, mas como plenamente
participativo no panorama criacional. Ele é denominado o “Alfa e Ômega”
(Apocalipse 1.8), haja vista, o fato de que perpassa do princípio ao final da
história temporal da criação. Se para o célebre historiador Marc Bloch
(1886-1944) a História é a ”Ciência dos homens no tempo”, eu definiria que a
História (na perspectiva bíblica) é a “Revelação progressiva de Deus no tempo”.
Deus é atemporal, pois é Eterno (I Timóteo 6.16), mas a História é exatamente a
temporalização do Eterno, evidenciado, no “Verbo que se fez carne” (João 1.14),
portanto, é o Eterno se inserindo na temporalidade para se revelar
progressivamente à sua criação. No cristianismo, a transcendência de Deus, isto
é, Ele é o “totalmente Outro” e sua imanência, ou seja, Ele é “plenamente imanente
a nós” não são dicotomias, mas convergências dialógicas, realidade
materializada no fato supracitado de que “O Verbo (que era Deus) se fez carne”
(João 1.1). Portanto, Deus é senhor da História.
Possivelmente, influenciado pela
leitura dicotômica existencial de Platão, muitos círculos teológicos desenham
um “conflito cósmico” entre bem e mal, luz e trevas representado por Deus e o
diabo, como se ambos fossem forças antagônicas conflitantes entre si travando
um combate cataclísmico. Que o diabo é a incorporação e a representação do
mal/trevas é fato bíblico, foi por sua sedução maliciosa que Adão e Eva pecaram
(Gênesis 3), sua atuação no mundo culmina em tragédias e destruições das mais
diversificadas, aliás, Jesus expulsou muitos demônios, haja vista sua missão
messiânica de “libertar os cativos” (Isaías 11.1-2) e ordenou aos discípulos
que também o fizessem (Mateus 10.1-11), afirmou, outrossim, que “Lhes deu poder
e autoridade” (Lucas 10.19) a despeito dos demônios. Não estou negando a
realidade tangível do mal. Mas mesmo o mal é subserviente ao poderio de Deus, satã
não é um agente livre que realiza o que quer ao seu bel-prazer, a história de
Jó é um bom exemplo disto. Desejoso de tentar Jó- “Homem integro e reto” (1.11),
o maligno precisou “pedir a Deus permissão para tocá-lo” (2.1-7). Gosto do
que Martinho Lutero (1483-1546) disse, a saber, que “O diabo é apenas um cão
raivoso preso na coleira de Deus”. Não insinuo desconsideramos o poder
(outorgado por Deus) que este ser maligno possui, antes, apenas, lembrar-nos
que o poder que satã possui é diminuto e subserviente ao único que detém “Todo
poder e autoridade” (Mateus 28.18), a respeito de quem todas as coisas lhe
estão submissas. O que também não infere que Deus seja o autor do mal. O mal é
resultado da livre escolha humana que legaliza a atuação do mesmo sobre si, como
Paulo bem ponderou “o salário do pecado é a morte” (Romanos 6.23), assim, fica
explícito, que as conseqüências trágicas resultam das decisões tolas. Mas a
atuação do mal não inibe a soberania de Deus. Aliás, uma informação é
importante. A palavra hebraica para mundo é Olam
derivada de hêlem que significa
ocultação. Que mensagem maravilhosa! O mundo oculta Deus, por trás de tudo
isso, está o Senhor de toda a criação, não distante, mas, operante.
Conscientes dessa soberania de Deus
é preciso atentar para mais dois fatos. O primeiro é que Deus tem uma aliança
com seu povo Israel (Êxodo 19-24) e com a Igreja enxertada mediante o
sacrifício vicário de Cristo (Mateus 27.51; Romanos 11.1-31). Sem delongar,
basta lermos sobre o cuidado e o zelo de Deus com seu povo durante o período das “Dez
pragas” no Egito, enquanto os egípcios eram assolados, Israel desfrutava de
livramento. Todavia, ao contrário de tantas pseudo-teologias triunfalistas, é
fundamental observar que mesmo o povo da aliança, ou seja, o povo de Deus não
está imune às crises e situações adversas. Nossa desobediência e obstinação
podem nos levar a esses momentos turbulentos. Por outro lado, o próprio Deus
pode nos conduzir “aos desertos da vida” (Deuteronômio 8.1-4; Mateus 4.1-11),
simplesmente a fim de nos “provar”, e antes que alguém pense ser isto mero “capricho
de um Deus tirano e vaidoso”, não é, antes revela o amor de Deus em usar
pedagogicamente as adversidades da vida para que amadureçamos e sejamos
aperfeiçoados para um propósito maior que às vezes são ocultados e só o tempo
ou a eternidade nos revelará. Paulo, nosso apóstolo (aos gentios), relata aos
Coríntios que passou várias necessidades, mesmo “Fome, sede, nudez, etc.” (I
Coríntios 4.11-13). Assim, como manter viva a esperança em tempos de
desesperança? Primeiro creia na soberania de Deus e confie que há um propósito
pedagógico na permissividade de Deus em relação às situações adversas de sua
vida, o mesmo Paulo que, por permissão de Deus, enfrentou tudo aquilo,
posteriormente disse “Aprendi a contentar-me com o que tenho. Sei estar
abatido, e sei também ter em abundância; em toda maneira e em todas as coisas,
estou instruído, tanto a ter fartura como a ter fome, tanto a ter abundância
como a padecer necessidade. Posso todas as coisas naquele que me fortalece”
(Filipenses 4.11-13). Que lindo! Paulo compreendeu que “Todas as coisas
cooperam para o bem daqueles que amam a Deus” (Romanos 8.28) e nós também
precisamos entender que nossa vida não será somente “vitória”, mas Deus usa as
nossas derrotas, frustrações, perdas, etc., visando um propósito maior. Por fim
(e a esse respeito valeria outro artigo) precisamos resgatar os fundamentos da
nossa fé: Quem somos? Porque estamos aqui? E para onde vamos? Se soubermos que
somos filhos de Deus em Cristo (João 1.11-12) que estamos aqui de forma
passageira (Filipenses 3.20) e que vamos para um lugar onde as Escrituras
prometem que “Deus enxugará dos nossos olhos todas as lágrimas” (Apocalipse 21.4),
somente então nos desfaremos do mundanismo e materialismo exacerbado que por
vezes se assenhoreou dos nossos corações, voltaremos como bem disse John Bunyan
(1628-1688) a sermos “peregrinos em caminhada indesistível ao céu”, conscientes
que “As aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em
nós há de ser revelada” (Romanos 8.18) e então, somente então, compreenderemos
o que Pedro disse “Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que,
segundo a sua grande misericórdia, nos gerou de novo para uma viva esperança, pela ressurreição de
Jesus Cristo entre os mortos” (I Pedro 1.3). Alegre-se! Nossa esperança é/está
viva!
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